A “árvore genealógica” amplamente aceita dos seres humanos antigos está gravada em pedra há décadas, e uma nova onda de descobertas e interpretações diferentes estão desafiando as classificações estabelecidas. O caso dos Denisovanos, antigos hominídeos conhecidos principalmente por fragmentos esqueléticos limitados até recentemente, destaca essa instabilidade. Um grande avanço em junho ocorreu quando evidências moleculares ligaram um crânio anteriormente misterioso da China a esse grupo indescritível, efetivamente dando aos Denisovanos um rosto reconhecível – ou assim parecia.
No entanto, esta identificação aparentemente definitiva está a ser contestada pelo antropólogo Christopher Bae, da Universidade do Hawai’I, em M3noa. Ele acredita que o crânio deve permanecer classificado dentro de uma espécie diferente, Homo longi, demonstrando o debate em curso sobre como categorizar nossos ancestrais. Bae está no centro deste debate, e a sua equipa propôs recentemente a adição de duas novas espécies à mistura: Homo bodoensis e Homo juluensis.
Estas propostas geraram controvérsia, em parte porque Bae e os seus colegas desafiaram as regras tradicionais que regem a nomeação de espécies. Ele argumenta que essas regras se tornaram obsoletas e não levam em conta a necessidade de retirar nomes ofensivos ou garantir pronunciabilidade e clareza. A sua perspectiva sublinha uma questão mais ampla: pode a adesão rígida às regras científicas estabelecidas dificultar o progresso na compreensão da complexidade da evolução humana?
** A viagem de Bae: origens e a busca da compreensão**
A paixão da Bae por compreender as origens humanas decorre de uma viagem pessoal. Nascido na Coreia e adotado por uma família americana depois de ser abandonado quando criança, ele experimentou um profundo desejo de descobrir sua própria origem. Depois de ter sido negado o acesso a informações sobre seus pais biológicos pela Agência de adoção, ele encontrou consolo e propósito no campo da antropologia biológica, uma disciplina que lhe permite explorar as origens humanas mesmo na ausência de informações completas – espelhando sua própria história pessoal incompleta.
“O objetivo básico da Paleoantropologia é reconstruir o passado, mesmo sem todas as peças do quebra-cabeça… no meu caso, nasci na Coreia, depois fui abandonado… Mas depois fiz um curso de Introdução à antropologia biológica e encontrei um campo onde podia explorar as origens.”
** Desafiando as classificações estabelecidas: * Homo bodoensis * e * Homo juluensis***
Duas espécies frequentemente discutidas no contexto da ancestralidade humana são * Homo heidelbergensis * eHomo rhodesiensis. Em 2021, A equipe de Bae propôs substituir ambas por uma única nova espécie, Homo bodoensis. Esta sugestão surgiu da observação de que o Homo heidelbergensis tornou— se um “táxon de lixo”-uma categoria abrangente para fósseis de um período de tempo específico que não se encaixava perfeitamente em categorias estabelecidas como o Homo erectus, o Homo neanderthalensis ou o Homo sapiens.
A resposta a esta proposta foi mista, com alguns a elogiar a necessidade de um debate mais alargado, enquanto outros a rejeitaram como infundada. No entanto, um workshop de 2023 envolvendo 17 paleoantropólogos resultou em um acordo de que o Homo heidelbergensis deve ser reconsiderado e que o Homo rhodesiensis, devido à história colonial de seu homônimo, deve ser removido do uso científico.
A Comissão Internacional de Nomenclatura Zoológica (ICZN), órgão responsável por julgar esses casos, resistiu a essas mudanças, afirmando que não retirará os nomes das espécies com base em preocupações éticas. A Bae contestou esta decisão, destacando um conflito fundamental entre o desejo de práticas científicas inclusivas e a adesão do ICZN às orientações tradicionais.
** A importância dos nomes: de besouros de Hitler a Xujiayao**
O debate sobre nomes científicos não é apenas um exercício Académico. Bae ilustra as consequências potenciais de nomes inadequados usando o exemplo de um besouro da Eslovénia, originalmente nomeado após Adolf Hitler. Hoje, esses besouros são itens de colecionador procurados entre os neonazistas, potencialmente levando a espécie à extinção. Isso ressalta a necessidade de nomes respeitosos, acessíveis e que não contribuam inadvertidamente para ideologias prejudiciais.
A Bae defende uma abordagem mais colaborativa para a nomeação, incentivando os cientistas a consultar colaboradores locais para escolher Nomes que sejam cientificamente precisos e culturalmente aceitáveis. Ele acredita que a tendência mudará para nomes mais fáceis de pronunciar e entender, levando a uma acessibilidade mais ampla e a uma maior compreensão da evolução humana.
** Controvérsias recentes: Xujiayao e a conexão Denisovana**
Bae e seus colegas encontraram recentemente novos desafios com o ICZN ao propor uma nova espécie baseada em fósseis de Xujiayao, China. Os pesquisadores descobriram vários fósseis de hominídeos neste local na década de 1970 e, após uma análise detalhada, incluindo a reconstrução virtual de um fragmento de crânio, a equipe de Bae concluiu que esses fósseis representavam uma espécie até então desconhecida.
Embora inicialmente tenham proposto * Homo Xujiayaoensis, um nome derivado do nome do site, eles finalmente escolheram Homo juluensis*, que significa “cabeça grande”, acreditando que o primeiro seria difícil de pronunciar para falantes não chineses. No entanto, mesmo essa escolha gerou polêmica, já que a nomenclatura científica aceita exige a adição de um “i” ao final dos nomes, levando a pronúncias potencialmente confusas.
Além disso, os fósseis de Xujiayao partilham semelhanças notáveis com os molares de Denisovan, levando a especulações sobre uma possível ligação. Pesquisas recentes ligaram os mesmos fósseis Denisovanos ao Homo longi, uma interpretação alternativa apoiada por muitos pesquisadores. A Bae sublinha, no entanto, que a análise de proteínas genéticas para a identificação de espécies a este nível de distinção está sujeita a erros.
Ele continua a apoiar * Homo longi * e incentiva uma investigação mais aprofundada para determinar se os fósseis de Xujiayao e Xuchang devem ser atribuídos a Homo longi ou Homo juluensis, observando a tendência atual entre os proponentes do Homo longi de incluir todos os fósseis nesta única espécie.
** Enfrentando Críticas: Uma Pele Grossa**
Apesar de enfrentar críticas consideráveis, a Bae permanece inabalável, enfatizando a importância da resiliência diante de pontos de vista opostos.
“Neste ponto de nossas carreiras, desenvolvemos pele grossa.”
O debate em curso em torno da nomeação e classificação de espécies humanas antigas sublinha a complexidade da interpretação do registo fóssil e a necessidade de diálogo aberto, inclusão e vontade de desafiar as normas estabelecidas na busca de uma compreensão mais completa da evolução humana

























